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A Invenção de Morel - Adolfo Bioy Casares

O livro se apresenta em forma de um diário de um perseguido político venezuelano que foge para uma ilha remota e misteriosa onde, em 1924, um milionário excêntrico construiu uma capela, um hotel-museu e uma piscina, hoje abandonados. A ilha é rodeada com a lenda de que fora abandonada, pois abrigava uma misteriosa moléstia que "mata de fora para dentro". Ele faz o uso de imagens durante toda a narrativa e seu caráter é bastante descritivo. O livro se inicia com uma breve descrição de como ele fora parar nesta ilha, das dificuldades que tem passado e com a explicação do por que está escrevendo. Alega que sua sobrevivência seria um verdadeiro milagre já que está vivendo sob condições muito adversas e que gostaria de deixar um testemunho desse milagre. Seguido disso, ele descreve o que tem na ilha e as pessoas que ali surgem: um estranho homem, uma mulher de aparência cigana por quem se apaixona perdidamente e se torna o centro de suas atenções e alguns outros habitantes sem tanta importância.

No decorrer da trama, o protagonista narra as dificuldades que tem passado, as doenças pelas quais é acometido, seus progressos e fracassos diante da tentativa de sobreviver nessa ilha como foragido. Seus relatos são não só factuais, mas também psicológicos, o que dá ao leitor a liberdade de interpretar se os acontecimentos absurdos são fruto de uma loucura adquirida nesses anos de fuga e solidão ou se são de fato reais. Nessa linha entre o real e o imaginário suposto, o foragido foca sua narrativa nos desconhecidos subitamente surgidos na ilha, em especial na moça pela qual anseia ter, Faustine. Eis que, quando o personagem decide finalmente entrar em contato com ela, deixando de lado qualquer prudência quanto a ter que prestar contas com a justiça por sua condenação, a trama se intensifica e a questão da loucura se torna cada vez mais presente na mente do leitor: a moça parece não percebê-lo. Por mais que ele faça de tudo para chamar sua atenção, tentando falar com ela e se expressar por gestos majestosos - ele planta um jardim inteiro com uma mensagem para ela -, ela ignora sua existência.

Morel, acompanhante de Faustine, é igualmente misterioso. O fugitivo analisa as conversas destes dois personagens, suas atitudes, e ainda assim não descobre se são amigos ou amantes. A dúvida o persegue. Não consegue determinar também o porquê de nenhum deles conseguir vê-lo. O foragido é completamente invisível aos olhos de qualquer pessoa da ilha, mas os animais ainda o sentem. Após alguns trechos da história, é descrita uma cena em que os personagens jantam no museu, e o protagonista os observa. Este é o clímax. Morel pára o jantar para dar a todos uma grande notícia. A notícia sobre sua invenção, uma máquina de eternizar o tempo. Diz a verdade sobre a ilha, sobre a semana em que ele e seus amigos haviam passado lá. Na realidade, já estavam todos mortos. A máquina destruía os corpos, enquanto montava projeções, sendo esta a tal moléstia que matava de “fora para dentro”. As imagens seriam projetadas nas paredes do museu e em todos os cenários da ilha, para sempre. O fugitivo então percebe, que tudo não passava de uma “mentira”. Faustine, sua amada, era uma espécie de fantasma, uma ilusão. Mesmo assim, decide que deveria passar o resto da eternidade ao seu lado. Submete-se ao processo de eternização, colocando a máquina para funcionar em si, ao filmar momentos em que está próximo de Faustine.
É possível compreender, a partir desta obra literária, a relação entre amor e imagem de forma mais esclarecida, uma vez que o livro trata de um caso de um amor por uma imagem insubstancial. Afinal, o amor não é sempre direcionado a uma imagem criada? Não há amor pelo real de fato, mas sim pelo imaginário, ou seja, uma ilusão que criamos e mantemos para amar a partir do real, que nos parece mais bela e adorável do que o objeto de amor em si. No livro, as projeções são imagens ao fugitivo – que é observador – e a imagem de amor que cria por Faustine é gerada por ele. O sentimento inicia-se no interior de alguém, e quando é exteriorizado, se transforma numa imagem. A imagem é justamente a pessoa amada, porém como ela é vista aos olhos do apaixonado. Ela é diferente perante seu olhar, apesar de continuar a mesma. No livro podemos juntar a imagem adquirida e a gerada no mesmo exemplo: Faustine. Pela sua existência ser uma projeção, ela e uma imagem, da forma mais literal que a palavra possa adquirir. O  amor do fugitivo por sua projeção, também passa a ser uma imagem, gerada a partir dele; o amor altera o jeito como ele a vê. A invenção de Morel é contemporâneo e possui uma validade universal, com um valor inegavelmente vitalício para avaliar o poder das representações e reproduções visuais

http://comunartes.blogspot.com.br/2013/01/a-invencao-de-morel-resenha.html

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