Um crime bárbaro chocou a população de Buenos
Aires (Argentina) na década de 1980. Um açougueiro, tido como um homem de
personalidade pacata, esfaqueou o dono da casa de carnes em que trabalhava em
plena luz do dia, sem qualquer preocupação de discrição. A ocorrência ganhou as
páginas do livro El Patrón, Radiografia de un Crimen, escrito pelo criminólogo
Elías Neuman, respeitado cientista forense. O diretor Sebastían Schindel
escolheu, para sua película de estréia, um roteiro homônimo adaptado da obra do
advogado, um questionamento sobre o outro lado de um homicídio à sangue frio.
No elenco estão Joaquín Furriel, Guillermo Pfening, Mónica Lairana e Luis Ziembrowski.
A coprodução entre Argentina e Venezuela
conquistou 11 honrarias internacionais de cinema. O protagonista, Joaquín
Furriel, é responsável por três dos troféus recebidos: melhor ator nas mostras
de Guadalajara (México) e Huelva (Espanha), e no Prêmio da Academia Argentina
de Artes e Ciências Cinematográficas. Hermogenes (Joaquín Furriel) é um homem
simples, tímido, de poucas palavras e acostumado a trabalhos pesados. Ele faz
um movimento comum de moradores de cidades pequenas, e deixa um humilde
município da província de Santiago del Estero em busca de trabalho na capital,
Buenos Aires. Semi-analfabeto e com pouquíssimas chances de ascensão social,
conforma-se com pouco e aceita um emprego como ajudante do açougueiro Armando
(Germán de Silva) em uma modesta casa de carnes.
Seu destino muda com a chegada de Latuada (Luis
Ziembrowski), o dono do estabelecimento. Homem arrogante, mal-educado e de
hábitos grosseiros, ele enxerga em Hermogenes a possibilidade de alavancar
outro mercado. A suposta promoção, na verdade, é uma fraude. Ele precisa morar
em um quarto nos fundos do armazém, em condições precárias de habitação. De seu
salário, são descontados o aluguel dessa pocilga – onde se aperta com a esposa,
Gladys, (Mónica Lairana) –, 30 quilos de carne e a prestação de um apartamento
ainda em construção. Dia após dia, o açougueiro e sua família são humilhados.
Em um episódio de raiva extrema, o magarefe enfia uma faca no abdome do chefe.
Em um arranjo de interesses, tem a sorte de ser representado por Marcelo Di
Giovanni (Guillermo Pfening), advogado escalado para o caso.
A radiografia de um crime, proposta no título do filme, é
bem mais extensa. É, em última análise, um raio x da realidade social de muitos
países. Hermogenes aceita circunstâncias sub-humanas de vida por falta de
opções. É a representação de uma fatia da população lembrada pelo poder público
unicamente no momento de colocá-lo atrás das grades, mesmo sem ter recebido seu
quinhão das obrigações do próprio estado, como educação, saúde e trabalho.
Latuada, por outro lado, é a face opressora de um capitalismo desenfreado e
desleal, onde o lucro vale acima de tudo. O empresário mantém seu funcionário
em condições análogas ao feudalismo e vende carnes podres para seus clientes
sem qualquer resquício de remorso. Recorrendo a flashbacks, o roteiro deixa no
ar o questionamento: quem é o verdadeiro vilão dessa história?
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